quinta-feira, abril 19, 2012

Petrobras e os dilemas da gestão de estatais


Temos estatais muito poderosas sob o controle total e irrestrito do governo

Cerca de um mês após ter sido indicada Presidente da Petrobras, a engenheira Graça Foster declarou, de forma enfática, que seria “lógico” aumentar os preços da gasolina. Com o preço do petróleo em patamar elevado, continuar segurando artificialmente os preços do combustível causa um gigantesco dreno no caixa da estatal.

Mas o risco de inflação preocupa muito o governo e, pouco tempo depois, Edison Lobão (Ministro das Minas e Energia), sob o aval da Presidente Dilma, contradisse Graça Foster ao afirmar que o preço do combustível não sofreria reajuste. Ao que Foster prontamente aquiesceu, dizendo que, de fato, a política de preços não seria alterada. Resultado: queda de quase 3% das ações da Petrobras em um único dia (5 de março).

A experiência internacional sugere uma boa prática para a gestão de estatais é ter um corpo técnico altamente qualificado e com autonomia para tomar decisões que garantam competitividade à empresa. Por ser profissional de carreira da Petrobras, com ampla experiência no setor, Graça Foster certamente atende ao quesito técnico, assim como os diversos engenheiros e gestores especializados que trabalham na empresa. Mas a sua real autonomia, como o caso do preço da gasolina demonstra, é questionável.

Foster estava correta ao dizer que é lógico aumentar o preço da gasolina. Não ocorre reajuste desde 2009, ainda que os preços do petróleo tenham disparado de lá para cá.
Foster estava correta ao dizer que é lógico aumentar o preço da gasolina. Não ocorre reajuste desde 2009, ainda que os preços do petróleo tenham disparado de lá para cá. Subsidiar o consumo do combustível usando o caixa da empresa compromete a sua capacidade de crescer e investir. Além disso, prejudica os acionistas minoritários – aqueles que investiram na Petrobras mas, ao contrário do governo, não mandam.

Alguns podem dizer que os minoritários já deveriam estar cientes de que estatais estão sempre sujeitas a interferência governamental. São empresas que, além do lucro,seguem outros objetivos ditados pelo governo. Mas os governos vêm e vão, com metas e intenções distintas. Incertezas dessa ordem acabam afugentando novos investidores e aumentando o custo de capital da empresa. Além disso, como ficam os trabalhadores que foram estimulados pelo governo a investir parte do seu FGTS nas ações da Petrobras? Ou aqueles cujos fundos de pensão têm nacos minoritários na estatal?

Além de uma maior autonomia técnica às estatais, outra boa prática é submetê-las a órgãos reguladores independentes e igualmente compostos por técnicos. Órgãos que tenham competência para estabelecer políticas setoriais que não sejam apenas reflexo do que quer o governo em exercício. Mas as várias agências reguladoras no Brasil perderam força e se tornaram focos de empreguismo e corrupção – como mostrou artigo da Época, em julho do ano passado,sobre a própria ANP (Agência Nacional do Petróleo).

No final das contas, temos estatais muito poderosas (leia-se: com amplo caixa e penetração na economia) sob o controle total e irrestrito do governo.Acabam sendo ferramentas de governo e não de estado. Ao interferir na Petrobras, o governo atual pode ter até uma boa intenção, que é evitar um eventual surto inflacionário. Mas, sem a devida autonomia técnica, as estatais podem ser usadas para motivos não tão nobres. A verdadeira liderança política nãoimplica poder de mando, mas a criação de bases institucionais que justamente isolemo setor público desse risco.

Sérgio Lazzarini é Professor Titular do Insper e autor de “Capitalismo de Laços: os Donos do Brasil e suas Conexões”. E-mail: sergiogl1@insper.edu.br

Fonte: Época

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